Olá a todos.
Em janeiro desse ano havia postado um aviso de não poder postar a matéria até então prometida da sala furry na AF. O porquê disso ter acontecido foi por causa do momento delicado que estava passando o assunto (até mesmo a revista Neo Tokyo fez uma matéria, que não foi lá o que muitos queriam ver sobre furry em um meio de comunicação) e não era saudável aumentar ainda mais a pressão sobre o qual o fandom sofria na época.
Como as coisas parecem ter esfriado (e de diversas manifestações agredindo a integridade do Na mata!), apresento agora a matéria da Anime Friends 2007.
Começando...
Ano passado, no dia 14 de julho, foi realizado em São Paulo o maior evento de animes da América Latina. A ANIME FRIENDS reúne todo ano milhares de fãs de anime do Brasil todo que adoram esta "arte". No evento rola de tudo, de karaokê a torneio de jogos e de cosplayers. Até mesmo artistas japoneses aparecem e divulgam seus trabalhos, além de darem autógrafos e, por conseqüência, conhecer nosso amado país.
Mas houve uma manifestação peculiar neste evento. Me refiro ao espaço reservado para divulgarem o fandom furry no Brasil. Uma grande oportunidade de tirar do ostracismo o fandom e apresentar ao público o que é na verdade furry.
Com toda a estrutura do evento, seria questão de tempo aprenderem e perceberem que o fandom é legal e rico em conteúdo. Campanhas de RPG e até mesmo mangas estão cheios dessas criaturas antropomórficas e, além do mais, muitas delas já são vistas por nós desde que éramos crianças, encontradas em desenhos animados e revistas em quadrinhos.
Mas o que deveria ser um ode a alegria acabou se tornando algo aquém do que fora esperado. Infelizmente a apresentação, esperada por muitos com muito anseio, fora as declarações de entusiastas em fóruns do fandom, foi fraca, desperdiçando uma boa chance de finalmente mostrar ao público sobre o que realmente significa o fandom.
De acordo com Kurama, um user que também faz parte do corpo docente do fórum Furry Brasil (www.furrybrasil.org), ele não tinha nenhuma expectativa pelo que seria exposto na sala. "Eu só tinha acompanhado a coisa por cima e não sabia o que haveria por lá", disse, também mostrando que imaginava: "Bom, pensei que seria uma sala quase totalmente voltada pra "lobisomem: o apocalipse" e coisas do tipo", frisa ele.
Ainda continuando, Kurama foi cauteloso quanto ao que achou da sala. "Bom, eu não vi muito da sala, mas não me surpreendi não, a achei meio ruinzinha, mas pra uma primeira vez tava bom." Mas, quando perguntado sobre o que realmente faltou, e os problemas em si, ele foi sucinto: "Faltou material, a sala ficou muito vazia. eles precisariam ter trazido mais imagens, mais coisas em geral pra decorar melhor a sala, chamar mais a atenção."
Com relação a visitação à sala, ele disse: "Bom, eu sei que a sala foi meio fraca e sem muita visitação, mas como eu disse antes isso está bom pra uma primeira vez." E quando foi novamente perguntado sobre a qualidade da sala, ele continuou sendo cauteloso: "Como eu disse essa foi uma primeira vez."
Aproveitando a polêmica que Kurama levantou sobre a organização e a estrutura, damos a palavra à Ronan, que também é user do fórum Furry Brasil. Perguntamos a ele qual era a sua função na equipe. "Era um faz tudo. Um garoto havia desistido de participar da sala e eu fiquei com os vips dele. Resolvi ajudar. Inicialmente só na programação. Depois ajudei levando TV e DVD e organizando algumas coisas".Aproveitando o momento, perguntamos sobre os problemas que ele enfrentou durante a organização, assim como da equipe em geral. "Uma boa parte foi inicialmente prejudicada pela falta da TV e do DVD no começo. Depois foi modificada porque alguns não aceitaram e surgiram outros problemas".
Perguntado sobre as pessoas que ele havia dito, ele frisou que "alguns que se dizem furries, uma panelinha na verdade. Os problemas foram o preconceito de alguns deles com fursuits e achar que podiam mudar a programação da sala. A Yamato, que organiza os eventos, é muito rígida. Não aceitava mudanças na programação. Então a situação ficou muito mal resolvida", diz Ronan, que não estava muito satisfeito com a sensação de preconceito quanto a fursuits. "Isso já foi questionado várias vezes por mim e pelo Ceruno e foi um dos motivos do nosso afastamento do fórum (Furry Brasil). Do mesmo jeito que existem preconceitos por aí existe o com fursuits e fursuiters. É algo que não sabemos explicar. Só sentimos os efeitos. Inclusive, no fórum e no evento nós pedimos explicações dos motivos do preconceito. Por que eles, que são furries, não aceitam os outros furries como eles são? Essa resposta nunca tivemos, e desistimos de ter." relata Ronan que, junto com seu amigo, segundo ele, foram injustiçados. Mas mesmo com o preconceito rolou fursuits. "Sim, nós não nos deixamos levar pelo que esses furries falam..O que eles acham é problema deles. Rolou do mesmo jeito que vai rolar no Abando. Lá o Alster se encarregou de defender eu e o Ceruno que não vamos poder ir.", explica a situação Ronan, acrescentando que haverá o Abando, uma reunião de furries em um sítio em fevereiro de 2008 no município de São Roque, em São Paulo.
Para terminar seu relato, Ronan deixa bem claro seu ponto de vista. "Bom, eu acho ridículo. Ao invés de aceitar e aprender com as diferenças eles ignoram as minorias que usam fursuits e tratam o furry como se fosse algo perigoso que não deve ser divulgado no Brasil. Dá a impressão de terem vergonha de serem furries".
Voltando à ANIME FRIENDS, Ronan explica sua posição quanto ao que foi mostrado e a aceitação do público. "Boa. O publico em geral não conhecia furry. Então muitos acabaram gostando, outros não. Foram opiniões bem diversas. A maioria gostou, mas muitos que não conheciam acabaram não se interessando muito. Mas é algo normal. Sempre tem aquelas pessoas que descobre o que é furry e não se identificam."
A respeito dos visitantes, ele disse que "Por parte dos visitantes não houve nenhum comportamento ofensivo ou provocativo. Só por parte de alguns furries mesmo". Imediatamente, ele conclui: "Não provocaram diretamente, mas alguns acabaram criando problemas quando resolveram mudar a programação e não gostaram se saber que não mudaríamos." Para ele, houve uma certa desunião por parte dos furries no evento. "Alguns furries tentaram mudar as coisas sem nem mesmo fazerem parte do grupo dos organizadores da sala. Opiniões são sempre bem vindas, mas infelizmente não dava pra mudar nada na programação. Sem falar naquela velha história das fursuits: eles simplesmente não gostam, então resolveram implicar com o ceruno".
Para tirar a dúvida de alguns que estão lendo este artigo, perguntamos a Ronan quem é Ceruno. "Ceruno é um furry que faz fursuits e fantasias com pelúcia. Está ganhando fama no exterior e aos poucos dentro do Brasil. Já enfrentou muito preconceito, especialmente por parte da família. Por isso mesmo terça-feira ele está indo para o Japão. Nos eventos de São Paulo as fantasias de Digimon deles são muito famosas. Foi o criador e organizador da sala furry". E a implicância com ele era uma constante. "Ele estava de fursuit, sem falar que é o furry que mais defendeu publicamente o direito de usar fursuits (se quiser conferir, na revista New Tokyo mais recente saiu uma reportagem com ele sobre furry). Muitos dos videos que passavam na sala eram de eventos estrangeiros. Obviamente apareciam muitas fursuits e eles não gostaram de ver isso. No geral é vergonha e medo de ver o furry divulgado no Brasil do mesmo jeito que é no exterior. Mas tem alguns, claro que, nunca disseram isso, tem inveja do trabalho dele."
Mudando de assunto, e pra encerrar a participação na entrevista, Ronan resume bem o que houve na sala. "A programação era simples: tinha um rpg furry, e o resto do tempo se alterava entre exibição de vídeos e palestras. Não tem muito o que falar da programação. Dos acontecimentos, a maioria foram situações silenciosas. A pior parte foi no primeiro fim de semana. E é o que eu falei: os furries estavam inseguros, com vergonha. Acabou que eles não conseguiram mudar nada na programação e foram os outros dias lá só pra observar com um ar de provocação."
Diante tudo isso, a falta de união e, principalmente, da boa vontade de alguns "furries", de acordo com Ronan, foram os responsáveis pela fraca apresentação da sala. É o que diz também Akira, um jovem de 22 anos que a dois anos conheceu o termo furry pela Internet. Desde então procurou se aprofundar mais pelo assunto. Ele esteve presente 4 dias do evento. Morador de Osasco, interior de São Paulo, ele explica como conheceu o termo furry. "Procurava imagens na net para ilustrar umas partidas de lobisomem e caí numa página de um artista furry.Desde então tenho acompanhado fóruns e artistas furry, mas sem entrar no fandom. Acho que preciso conhecer melhor o fandom".
Perguntado o seu ponto de vista do fandom em caráter mundial, ele indaga: "Acho que tem gente que simpatiza com animais e acaba simpatizando com o fandom, só que vejo que tem muita gente que leva a coisa a sério demais e isso é o que me afasta do fandom." O porquê do preconceito ele também respondeu. "Medo de que meus amigos achem que isso é coisa de retardado, tarado, zoófilo ou algo assim. Pra mim não tem nada a ver com essas coisas. Tem um lado meio espiritual. Mas você sabe como o povo é, né? Senta o pau no que acha estranho e dane-se". Completando a sentença, ele diz que "no caso do fandom nacional, eu acho que não é igual lá fora, o povo não encarna que é bicho e se comporta igual retardado como lá fora. Tem exceções, mas são minoria. Liberdade de expressão, como eles dizem que é, é uma coisa, senso de ridículo é outra.E sobre aidentidade nacional, não tenho opinião sobre isso porque não sei direito como é lá fora, mas sinto que o nosso fandom é como o americano, mas sem muitos desses que levam a coisa a sério ou que vivem de yiff".
Akira também sabe que, de acordo com o que percebe em fóruns e chats furry, o orgulho deser furry se mistura com soberba. Resumindo, furries se achando superiores a humanos, quase se parecendo com comportamentos neo-nazistas. Mas ele responde: "Não usaria esses termos, mas acho isso ridículo. Eles estão esquecendo que também são humanos como eu ou você. Acho que quem se diz superior com isso está querendo compensar algum trauma pessoal. Acho que egocêntrico e cabeça dura caem melhor. Me parece mais teimosia de criança que outra coisa". Ele ainda ressalta que uma vez teve contato com furries que tinham seu estilo de vida bem atrelado com a sua própria vida. "Um americano que conheci tinha disso. Só que no caso dele tinha mais a ver com a espiritualidade dele e, pelo que vi, ele não saia por aí falando que se sentia um animal. O cara sabia que se saísse falando iam zoar ele e a crença dele, então ele era reservado com isso. Quando a pessoa pensa dessa forma acho que não tem problema. Agora eu vi um lance assim em um chat, só que em um estado de patologia mesmo, e isso me deixou bem incomodado. Ele falava de como o pessoal na escola o maltratava por ele se comportar como um guepardo. Pelo que ele dizia era algo bizarro e não dá pra condenar de todo os amigos dele terem se afastado".
Ele também explica, no seu ponto de vista, o porquê da maioria dos furries serem bis e homos. "Não acho que sejam a maioria, mas são os que se expõem mais, porque no fandom se sentem mais a vontade para expor não só o que pensam como a sexualidade e por isso aparecem mais. Pode ser um tipo de fuga, uma válvula de escape, mas não sei falar bem sobre isso". E sobre os artigos da Desciclopédia, um site estilo a Wikipedia que busca satirizar tudo e todos, ele também quis se manifestar sobre a reação de alguns furries ao publicado por lá. "Achei que foi uma piada de mal gosto e só. Tem umas coisinhas engraçadas até, mas a maior parte pra mim é apelação. E acho que o povo reagiu dando margem para que ampliassem ou confirmassem o que escreveram lá. Algumas pessoas não sabem e não percebem, aí se ofendem. E se ofendem com pouco!".
Sobre Fóruns furry, ele também quis falar a respeito."Lá fora tentei acompanhar um fórum japonês, mas acabei sendo meio excluído por não ser natural de lá, mas isso é da própria cultura japonesa. Nesse fórum eles discutiam de tudo que fosse ligado ao fandom, sem se bitolarem muito. Acompanho de longe um fórum brasileiro, mas não me sinto a vontade de participar dele". Ele, até esta entrevista, não tinha conhecimento de que havia mais fóruns furry por aqui. "Não sabia. Lia o Furry Brasil, mas nunca me senti a vontade de participar. Sou meio avesso a fóruns. Não gosto muito do ambiente de fóruns. As vezes saem discussões por besteiras." Akira nunca havia participado de nenhum evento furry. A única coisa que havia visto desta natureza desde então era somente na internet e, mesmo assim, do exterior. "Não sei muito como é. Apenas acho que nos Estados Unidos são mais o pessoal que curte usar as fursuits e artistas que querem vender seus desenhos é que vão. Não sei bem como funciona. Além dessa sala furry que teve na ANIME FRIENDS, soube que vai ter um tal encontro chamado Abando. A proposta é diferente do que se faz lá fora, então acho que possa ser algo legal dependendo das pessoas que vão. Fora isso a única coisa que vi ligada a furry foi na Anime Friends desse ano, mas quero me esquecer que teve aquele estande lá".
Voltando ao assunto, que no caso é a apresentação da sala furry na ANIME FRIENDS, Akira não gostou do que viu. "Fui em cinco dias da Anime Friends e nos cinco procurei ir na sala com uma certa freqüência pra ver. Queria chamar alguém de canto para conversar sobre o assunto, me enturmar, só que sempre que eu ia ouvia algum comentário de alguém ou simplesmente ficava com vergonha de entrar pelo que estava rolando lá dentro. Só em um dos dias que um cara estava perto da porta e me explicou por cima. No geral só ficava um cara fantasiado sentado na porta e outro lá dentro dançando, com uns bichos de pelúcia na mesa, com um laptop rodando um vídeo de uns caras fantasiados. O pessoal estava usando a sala pra descansar pelo que pude ver. Ouvi até gente do staff rindo do estande. O que eu ouvi muito de quem passava perto da sala onde tava o estande era que era sobre cosplays de bicho de pelúcia, bando de hippies fazendo cosplay e por aí vai, e isso pra não falar dos comentários mais cruéis. Ninguém se interessou muito pelo assunto lá. Pela descrição que o estande tinha no site da Anime Friends realmente dava para considerar o estande uma piada".
Pedimos para que explicasse melhor o que ele quis dizer com comentários cruéis. "Olha, ouvi até chamarem o pessoal lá de bando de baitolas e isso foi só uma das coisas. E não acho que tiveram muita atenção. A descrição do estande no fórum e no mapa do evento não ajudou e até o jeito que eles fizeram o estande não ajudou. Eu me sentia constrangido e sem a mínima vontade de entrar lá dentro. Entrei só num dia pra dar uma descansada, como meio mundo tava fazendo. Ninguém tava prestando atenção em nada do que tava rolando lá. Eu já não tava muito afim de falar que gostava de furry para os meus amigos e depois de irmos lá na ANIME FRIENDS, muito menos". Quanto à programação, ele fez questão de dizer: "Pelo que vi não rolou nada. Não vi nem programação na porta da sala onde eles estavam como tinha nos outros estandes. Só ficava um cara fantasiado sentado na porta e os outros lá dentro conversando numa rodinha, isso quando um dos caras fantasiados não estava dançando no meio da sala. Também tinha umas coisas sem muito sentido no quadro negro. Minha reação a tudo isso? Fiquei meio decepcionado e envergonhado. A sensação que ficou é que furry é coisa de quem gosta de se fantasiar de bicho de pelúcia e apenas isso".
"Fursuits, podem até fazer parte do fandom, mas é estranho para quem não faz parte dele. Acho que o estande foi mal elaborado, foi pensado para agradar mais quem é furry e leva a coisa a sério demais e não para quem não conhece e acha certas coisas estranhas" é o que Akira completa, mostrando que houve uma superexposição de fursuits no evento. O que ajudou a afundar a sala foi a falta de uma programação e uma estrutura mais concreta. "Se visse como o estande da Pottermania estava organizado iria entender o que quero dizer. Eles fizeram o estande como se fosse uma sala de aula de Hogwarts e como se estivesse prestes a ter aulas ali das diversas matérias que aparecem no livro. Cada dia era um tema diferente. Você ficava curioso pra saber sobre aquilo. E olha que só li o primeiro livro do Harry Potter!"
Ele também disse que não faltou empenho entre os organizadores. "Acho que fizeram a coisa correndo e que fizeram tudo muito por conta própria, que não teve participação de muita gente e nem pediram a opinião de ninguém. Pareceu que foram mais pela opinião de um só do que de um pessoal maior. A sensação que eu tive foi essa de que o pessoal que organizou foi mais pelo ponto de vista deles do que pelo ponto de vista da maioria e essa maioria eu falo dos que participam das comunidades do Orkut ou do fórum. Acho que podiam ter pedido a opinião deles sobre como fazer o estande, o qual defino como uma apresentação Fraca. Eu não sentia a mínima vontade de entrar naquele estande".
Mesmo apresentando todos esses problemas, Akira não considera uma tragédia total. "Não foi catastrófica como está parecendo que foi, mas também não foi positiva e não agregou nada. Simplesmente não interessou ninguém e fez com que as pessoas achassem que o assunto da sala era outro. Todos que organizaram são meio novos no fandom e isso não ajudou".
Ao que tudo indica, a apresentação foi algo muito precipitado e que deveria ter tido um melhor planejamento e estrutura. Outra coisa que também influenciou na péssima exibição foi a falta de união dos furries que estiveram na sala. Isso sim é algo bastante inconveniente, ainda mais se levarmos em consideração o quanto o fandom é depreciado na Internet. Bem, que isso seja uma lição aprendida para os próximos anos, assim como outras manifestações furry no Brasil.